sexta-feira, 13 de maio de 2011

After the Curtain

Sentou na beira da cama. Tinha algumas opções. Poderia olhar pra cidade amanhecendo, para as pessoas sem alma e sem vontade indo trabalhar, para os aviões - malditos aviões - roubando o céu dos pássaros, o céu dela, se apoderando de coisas que os humanos, por natureza, não deveriam... Ocupar. Poderia observar o movimento do hospital que ficava logo ali, na rua principal. Vez ou outra ela conseguia pegar alguém sendo levado às pressas por ferimentos graves, como total falta de esperança, o que geralmente explicava as faixas nos pulsos, ou o andar cabisbaixo de quem pensa "Porra, nem pra morrer eu sirvo". Estava desenvolvendo melhor a ideia quando percebeu algo se movendo atrás dela. Seria a segunda opção. Não tinha muito o que ver, pra ser sincera, já que ele tinha a odiável mania de cobrir-se por inteiro com o edredom, deixando então a mostra apenas os cabelos pretos ondulados. Imaginou que ele estivesse de boca aberta, babando em tudo que estivesse próximo dos lábios rachados, e com os braços abertos, em uma posição que, para quem observava, parecia extremamente desconfortável mas que, para ele, imaginava ela - e todas as outras que já o viram de tal forma - era a única coisa a ser feita com os braços que, quando não estavam sendo usados para tocar, desenhar, escrever ou acariciá-la, apenas atrapalhavam.
Escolheu a segunda visão e tratou-se de se enfiar nas cobertas. Que visão magnífica. "Ele deveria ser santificado", pensou ela. Era bonito demais para que alguém sequer considerasse outra opção. O nariz "de leãozinho" constantemente vermelho, o cabelo que caia tão bem com todo o resto e ah... faltava talento de sua parte para descrevê-lo. Mas ela sabia que, quando chegasse o dia, ah, quando chegasse o fatídico dia em que ele levantaria de lá pra nunca mais voltar... sua beleza permaneceria em tudo que ele já tocou. Permaneceria nela e finalmente ela seria boa o suficiente.
Beijou-lhe os olhos que dormiam e foi fazer café.

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